Ottawa Knee Rules vs Pittsburgh Decision Rule

13-11-2018

As lesões do membro inferior são as mais comuns no desporto, destacando-se principalmente o tornozelo e o joelho (1,2,3,4,5,6,7). Os traumatismos apresentam uma incidência considerável na prática desportiva e, desta vez, vamos dar especial atenção ao joelho.

O meu atleta sofreu um traumatismo direto no joelho. Como devo proceder se não tenho a certeza do quão extensa é a lesão? Envio para imagiologia, ou não?

As lesões agudas do joelho representam uma elevada percentagem de ocorrências nas urgências (9). Muitos estudos têm vindo a demonstrar que apesar de exames radiográficos serem frequentemente utilizados como método de avaliação e despiste, apenas 5% dos utentes com trauma agudo do joelho apresentam realmente fratura (10,11).

Perante as evidências de que na totalidade das radiografias que são efetuadas ao joelho apenas uma pequena percentagem apresenta fratura, começam a ser valorizadas guidelines especificas (10,11,12,13,14).

Ainda assim, a par da aplicação destes testes específicos, é importante conhecer o mecanismo, a história da lesão e efetuar um exame físico adequado de modo a que seja realizado um correto diagnóstico e determinada a necessidade ou não de exames imagiológicos.

Os mecanismos mais comuns para a lesão do joelho são o traumatismo direto, a queda e a torção (9). De todas as lesões do joelho, as torções representam 75% do total. No entanto, 86% das fraturas do joelho têm origem num evento por traumatismo direto (9).

O risco de fratura aumenta com a idade sendo que, em indivíduos com mais de 50 anos, a probabilidade de fratura é quatro vezes maior, principalmente por problemas como osteoporose, maior frequência de traumatismos por contusão e maior incapacidade de proteger o joelho durante a queda (9). Por outro lado, a ausência de edema imediato, equimose, derrame, deformidade, aumento da temperatura ou laceração é um fator preditor significativo de uma radiografia normal (9).

Dois dos conjuntos de regras mais utilizados no contexto de avaliação clínica de um traumatismo agudo do joelho são as Ottawa Knee Rules e Pittsburgh Decision Rule.

Ottawa Knee Rules

Segundo estas regras qualquer indivíduo adulto que apresente dor aguda no joelho decorrente de um traumatismo direto deve efetuar radiografia se se verificar pelo menos um dos seguintes critérios (10,15):

  • Idade superior a 55 anos;
  • Dor à palpação na cabeça do peróneo;
  • Dor isolada na rótula;
  • Incapacidade para flectir o joelho até 90º;

Incapacidade para suportar peso imediatamente após a lesão ou Incapacidade de caminhar quatro passos completos na unidade de emergência;

Quando criaram estas regras, Stiel et al. ( (15) efetuaram um estudo que englobou 1047 indivíduos adultos com lesão aguda do joelho aos quais foram aplicadas as Ottawa Knee Rules. Os resultados demonstraram 100% de sensibilidade para fratura, tendo resultado numa redução de 28% no número de radiografias efetuadas.

Um ano depois, em 1996, Stiel et al. (16) realizaram um novo estudo que contemplava 1096 indivíduos adultos o qual culminou em resultados que demonstravam 100% de sensibilidade para identificar fraturas. A decisão de realizar ou não radiografia foi interpretada corretamente em 96% dos casos sendo que em 4% existiram falsos positivos (16).

Em 2001 foi publicado um estudo para validação destas regras que continha as seguintes caraterísticas (8):

Os resultados obtidos demonstraram valores para a sensibilidade de 100% e para a especificidade de 52% (8). Verificou-se ainda que todas as fraturas foram identificadas pela aplicação das regras e que existiu uma redução de 49% no número de radiografias efetuadas (8).

No que diz respeito aos valores preditivos, concluiu-se que o valor preditivo negativo é 100% e o valor preditivo positivo é 11% (8). Ou seja, não existem falsos negativos. No entanto, existe possibilidade de se identificarem falsos positivos, o que não acarreta consequências para o utente.

No entanto, na maioria dos estudos realizados para avaliação das Ottawa Knee Rules e apesar do valor para a sensibilidade ser semelhante e ter existido uma redução significativa do número de radiografias realizadas em todos (10,13,17,18,19,20,21,22,23,31,32), o mesmo não se verifica quando falamos de especificidade sendo que, em alguns desses mesmos estudos, esta apresentou valores mais reduzidos (31,32). 


Pittsburgh Decision Rule

Pittsburgh Decision Rule foi desenvolvida em 1994 com o objetivo de despistar fraturas do joelho de modo a reduzir o número de radiografias necessárias (29).Esta regra indica que indivíduos com traumatismo agudo do joelho que possuam menos do que doze ou mais do que cinquenta e cinco anos de idade ou não sejam capazes de efetuar quatro passos completos no serviço de urgência devem ser submetidos a radiografia (10).

Seaberg & Jackson (14) e Simon et al. (30) nos seus estudo referiram valores para a sensibilidade entre 77% e 100% e entre 57% e 79% para a especificidade. Cheung et al (10) referiram a possibilidade de reduzir o número de radiografias em 52%.

Num estudo de Weber et al. (27) foi constatado que uma fratura clinicamente significativa pode ser excluída em casos que o indivíduo possua mais de 18 anos de idade e seja capaz de caminhar sem claudicar ou cujo evento lesivo tenha sido uma torção e não exista edema considerável. Se existir presença de edema a probabilidade de fratura é 7.5 vezes maior.


Discussão 

Em 2003, uma meta-análise (28) concluiu que, de entre cinco testes ortopédicos avaliados, as Ottawa Knee Rules são a que possuem maior suporte da evidência.

No entanto, em 2013, um estudo comparativo entre as Ottawa Knee Rules e Pittsburgh Decision Rule (10) demonstrou valores semelhantes entre os dois conjuntos de regras para a sensibilidade mas no que diz respeito à especificidade, a regra de Pittsburgh demonstrou valores mais elevados (51%) quando comparada com as regras de Ottawa (31%).

Uma boa fiabilidade interobservador foi verificada em relação à Pittsburgh Decision Rule (k=0.71) enquanto que para as Ottawa Knee Rules esta apresentou valores mais baixos (k=0.51). 

Se o objetivo é verificar se realmente existe ou não a possibilidade de fratura, quer as Ottawa Knee Rules quer a Pittsburgh Decision Rule são extremamente sensíveis, o que nos permite avaliar com elevado grau de certeza e segurança.

Mas mais importante do que decidir entre qual dos métodos de avaliação optar (sendo que ambas apresentam valores elevados de confiança) é avaliar os benefícios da implementação de guidelines específicas nos departamentos de urgências. A redução do potencial número de radiografias realizadas ao joelho que pode ser alcançada permite também reduzir os custos inerentes, diminuir o tempo de espera dos utentes nas unidades de urgência e evitar a exposição desnecessária à radiação. Stiell et al. (24) verificaram que adultos submetidos a radiografia gastaram em média 118,0 minutos nas urgências enquanto que, com a aplicação destes métodos de triagem esse tempo foi reduzido para 85,7 minutos.


Conclusão

Tanto as regras de Ottawa como a regra de Pittsburgh são testes simples, rápidos e muito sensíveis para avaliação imediata do joelho após um traumatismo. Com uma bom apoio da evidência, principalmente as regras de Ottawa, devem ser utilizadas como primeira abordagem para despistar possíveis fraturas do joelho indicando assim a necessidade ou não da realização de uma radiografia.


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Texto da autoria de Mário Correia

Licenciado pela Escola Superior de Saúde do Vale do Ave, em Junho de 2017, sempre esteve ciente do percurso que pretendia para a sua vida profissional. Acompanhou os escalões de formação do Varzim Sport Clube durante os dois últimos anos de Licenciatura. Após conclusão da sua formação académica iniciou funções como Fisioterapeuta na Equipa Sénior do Varzim Sport Clube durante a Pré-Época de 2017/2018. 
Em Outubro de 2017 a sua ligação ao clube terminou e iniciou atividade profissional na Equipa Sénior Feminina do Póvoa Futsal Clube e no Hospital Particular de Barcelos, onde permaneceu durante nove meses. Valorizando a aprendizagem e formação constantes, em Fevereiro de 2018 iniciou a Pós-Graduação em Fisioterapia Desportiva - Especialização em Reabilitação, na CESPU. Já em Junho, a oportunidade de exercer atividade na Primeira Liga de Futebol surgiu, tendo assumido funções como Fisioterapeuta na Equipa Sénior do Moreirense Futebol Clube, onde permanece até ao momento.


Formação:

  • Licenciatura em Fisioterapia pela CESPU-ESSVA (2017)
  • Pós-Graduação em Fisioterapia Desportiva - Especialização em Reabilitação (02/2018 - 02/2019) 
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