O que as Direções e as Equipas Técnicas podem (e não podem) esperar do Departamento Clínico
É compreensível que seja cada vez mais difícil para as equipas técnicas saberem o que esperar dos respetivos departamentos clínicos. A disparidade no modo de atuação dos profissionais motivada por backgrounds e modelos de raciocínio cada vez mais variados (e de origem cada vez menos clara) leva a que os clubes, na figura dos seus departamentos técnicos, liderados pelos treinadores, possam ter cada vez expectativas menos realistas - ou mais deturpadas - acerca do trabalho que podemos providenciar em prol dos seus atletas.
Neste sentido, achei que poderia ser pertinente mencionar algumas das expectativas legítimas que o Departamento Técnico pode gerar do trabalho do Departamento Clínico - e do fisioterapeuta em concreto -, enumerar o que não deve ser esperado por ser parcial ou totalmente desajustado, e alguns modos de atuar que podem não ser benéficos de adotar.
KPI's
Uma das primeiras reflexões para a qual acho pertinente sensibilizar é o momento inicial da contratação do staff.
Já aqui (https://fisioterapia-desportiva-com-evidencia.webnode.pt/l/fisioterapeuta-por-25-milhoes/) abordei por alto a questão da forma como a entidade empregadora olha para o Fisioterapeuta e como o posiciona dentro das suas necessidades, prioridades e hierarquia de valor.
A questão que se coloca é: quando querem contratar um Fisioterapeuta, para que características olham? Aquilo que pretendem é alguém que consegue transportar as águas? É alguém para dar o jantar aos atletas? É alguém para fazer de tudo um pouco? Ou é alguém que possua e acarrete uma mais-valia real à metodologia de trabalho? Que providencie inputs importantes no quotidiano, que procure melhorar o ambiente de trabalho, e que seja capaz de tomar e partilhar decisões difíceis com responsabilização?
Compreendo a dificuldade dos clubes em perceber quem é bom ou quem não é. O que posso dizer é que, estatisticamente, o amigo do amigo dificilmente será uma boa escolha.
Franco Impellizzeri
Os KPI's são então indicadores pelos quais as direções dos clubes e os restantes stakeholders envolvidos na contratação dos departamentos clínicos (onde poderia estar por exemplo a equipa técnica) se deveriam guiar. Alguns destes poderiam ser:
- Currículo (Histórico, Trajeto, Funções, Formação Académica e Complementar)
- Personalidade (Determinação, Resiliência, Gestão de stress, Colaboração em trabalho multidisciplinar, Competências comunicativas formal e informal)
- Motivações (Perspetivas futuras, Desenvolvimento pessoal, Ambições, Visão, Remuneração)
- Skills Técnicas (Capacidade de resolução de problemas, Know-how técnico, Perspetiva ecológica de aplicação de conhecimento)
Cabe depois a cada instituição e entidade refletir sobre o que pretende para a sua estrutura, quer a curto quer a longo-prazo, e tomar decisões que permitam suprir as suas necessidades. Sem esta reflexão, sem saber que necessidade suprir, comprar o melhor ou o pior será igual... E igualmente caro.
Este processo não faz mossa apenas na perceção geral que se tem dos Departamentos Clínicos, mas principalmente coloca os clubes, e os seus atletas, sujeitos a más decisões, tomadas por maus profissionais, que foram contratados de forma voluntária.
É fundamental então sensibilizarmos que enquanto os próprios clubes não forem exigentes com os profissionais que contratam... Estão a contratar oportunistas e charlatões.
Estabelecer os critérios e mais-valia que se procura, e exigir-se que eles estejam presentes, é absolutamente mandatório.
Quanto a nós, Profissionais de Saúde que procuram singrar e melhorar o nosso trabalho, o local onde trabalhamos, a nossa reputação e a perceção de valor sobre nós, adoraríamos que aumentassem o nível de exigência esperado de nós. Mas então... Que características tem este tipo de exigência e o que podem esperar de alguém que cumpra estes requisitos?
Transparência e Humildade
Iremos considerar dois tipos de comunicação: informal - a comunicação que é desenvolvida no dia-a-dia e que tem o propósito de resolução e gestão diária de problemas, assim como o entrosamento de todas as partes envolvidas e que contactam com o Departamento clínico - e formal - que tem o propósito de veicular informação técnica e específica aos principais stakeholders sobre o trabalho desenvolvido, quer a curto quer a longo-prazo, pelo Departamento Clínico, de forma concisa e simples.
Aquela que iremos abordar mais concretamente é a segunda. Para a primeira, poderão consultar aqui https://fisioterapia-desportiva-com-evidencia.webnode.pt/l/comunicacao-em-fisioterapia-desportiva2/.
Milagres
Acontece que quando nos apresentamos a uma equipa técnica a explicar que não há assim tanta coisa que possamos fazer para prevenir em grande medida muitas das lesões que vão aparecer, eles assumem esta postura como uma tentativa de me salvaguardar em vez de um reconhecimento humilde da mais que sabida falibilidade dos nossos métodos.
Adaptado de Franco Impellizzeri
Honestidade e auto-exigência
O número de lesões não define a competência do Departamento Clínico... Quanto muito, define a competência da estrutura
Technicalities
Abordagem muito passiva
Nós também temos de querer o jogador em campo
Tempo para regressar
Reintegração
Eficiência e Gestão de recursos financeiros
Será importante realçar que existirem discrepâncias na forma de comunicar e/ou no modo de atuar entre os departamentos clínicos e técnicos não tem sempre de resultar de um deles estar errado ou a trabalhar mal. Muitas das vezes, pode ser só decorrente de haver expectativas desajustadas, pelo que é fundamental estabelecer, a priori, as regras do jogo.
Uma vez que o departamento clínico é o departamento de apoio ao departamento técnico, é muito importante que seja bem claro o que o segundo pode esperar do primeiro. Isto deve respeitar a sua filosofia e valores, mas deve compreender as necessidades (previamente conversadas) do projeto desportivo. Uma das forma de fazer isto é por exemplo através da elaboração de um documento de Missão e Valores por parte do Departamento Clínico (exemplo abaixo) para que as expectativas, metodologias de trabalho e objetivos sejam transparentes e decorram de um acordo entra ambas as partes.
Background Científico