A história (por contar) dos Tendões

01-06-2018

O tendão é o expoente máximo das estruturas cuja relação entre anatomia e função é muito íntima. Mas o que será que não nos têm dito acerca dele? O que há para desmistificar, especialmente ao nível da intervenção?

Anatomia

Organização e composição

O tendão é tecido conjuntivo composto essencialmente por fibras de colagénio e é a estrutura anatómica e funcional que liga a superfície óssea - o periósteo - ao músculo, na sua fáscia [1]. Hierarquicamente de forma crescente, este organiza-se em moléculas de colagénio, fibrilas, fascículos e por fim em unidades tendinosas. Esta organização hierárquica permite ao tendão ser uma estrutura funcionalmente mais capaz de transmitir forças [2], fator que é potenciado pela sua composição histológica e bioquímica.

Proposta de hierarquização anatómica de Khan [3]

Compostos por 65 a 70% de água [2], a percentagem de matéria seca é cerca de 70 a 80 % de colagénio Tipo I na proporção total deste tecido conjuntivo, que associada à presença de proteoglicanos - retenção de água e facilitação de deslizamento entre fibras - e glicoproteínas - estabilidade mecânica, promoção de regeneração e propriedades elásticas -, lhe conferem as suas características de força e viscoelasticidade, conseguindo armazenar e transmitir de forma efetiva as forças exercidas nas estruturas que lhe estão adjacentes [1]. Para além destas importantes especificidades anatomofuncionais, o tendão é uma estrutura pouco vascularizada [2] constituída por tenócitos (células tendinosas) e condrócitos (células cartilagíneas), que são as responsáveis pela produção das células estruturais do tendão com o colagénio, fibronectina e os proteoglicanos, fundamentais na reparação e homeostasia do tendão.

Podemos então assumir que o colagénio é o responsável pela tensão contrátil do tendão e as substâncias da matriz celular são responsáveis pela sua organização e diferenciação estrutural. Ambos são sintetizados pelos tenócitos [3].


Inserções

Já vimos então que o tendão liga o músculo ao osso. Desta forma, esta relação é descrita como uma relação osso-tendão-músculo [2], na qual se podem descrever a inserção tenoóssea (tendão-osso) e a inserção miotendinosa (músculo-tendão) [3]. Mas quais as características específicas de cada uma das inserções tendinosas?

Na junção miotendinosa, há essencialmente a transmissão de tensão que foi inicialmente gerada ao nível de proteínas contráteis intracelulares para proteínas do tecido conjuntivo extracelular. 

A junção tenoóssea permite a transmissão de energia do tendão para o periósteo, sendo que esta zona é bastante complexa e tem aproximadamente 1 mm de comprimento [4]. Esta pode ser dividida em 4 regiões com características marcadamente diferentes mas cuja alteração de morfologia é gradual [5]: 1) tendão; 2) fibrocartilagem; 3) fibrocartilagem mineralizada; 4) osso [3]:

  • Tendão - Este é constituído por por células de colagénio alongadas orientadas paralelamente.
  • Fibrocartilagem - O número de células em paralelo diminui, passando a organizar-se em pares ou filas com um pequeno número de células, que se tornam mais arredondadas e se localizam em torno da matéria extracelular.
  • Fibrocartilagem mineralizada - Esta região é separada imagiologicamente da anterior por uma linha perpendicular azul que abrange todo o tendão transversalmente. Algumas células preservam as características das regiões anteriores, ao passo que outras se tornam maiores e com um citoplasma em vácuo.
  • Osso - Osso laminar orientado aleatoriamente que se forma a partir da matriz mineral da região anterior [4] [5].

Vascularização

Um dos grandes debates da Medicina nos últimos tempos e das suas implicações na clínica é se o tendão é de facto vascularizado ou não. Do ponto de vista médico, é importante pois pode ser este fator a influenciar a descrição de tendinite ou tendinose. Se é certo que as manifestações clínicas, que são aquelas que são de facto alvo do fisioterapeuta, não variam entre ambas, a verdade é que faz diferença sabermos se um tendão é irrigado ou não, pois isto influencia o estabelecimento de determinado programa de intervenção, a sua progressão e o prognóstico de reabilitação, que beneficiará largamente de o tendão ser vascularizado. Através de um estudo microscópico da composição histológica das estruturas ligamentares e tendinosas, Cooper e Misol [5] relatam ter encontrado, citando, "por acaso", um pequeníssimo número de estruturas vasculares como capilares, arteríolas e vénulas que se propagavam do sentido das fibras do tendão.

O'Brien divide a vascularização do tendão em 3 regiões, de forma similar à divisão estrutural anatómica: a junção miotendinosa, o comprimento do tendão e a junção tenoóssea. Esta irrigação sanguínea é provenientes de estruturas vasculares prévias com origem no perimísio, periósteo e pela zona periférica do tendão como o paratendão e mesotendão.

  1. Na primeira zona, os vasos vêm do perimísio e penetram a estrutura tendinosa, continuando longitudinalmente.
  2. Em zonas tendinosas sujeitas a fricção, a irrigação pode ser proveniente das tais zonas periféricas - neste caso, do paratendão - e da própria estrutura sinovial na qual esta região do tendão está inserida. Depois de entrarem no endotendão, as arteríolas são flanqueadas por duas vénulas e é possível encontrar ocasionalmente capilares sanguíneos que não entram no colagénio.
  3. Nas "último terço" do tendão, na junção entre o tendão e o osso, existem anastomoses entre os vasos, uma vez que estes não conectam diretamente entre si devido à grande abundância e desorganização do tecido fibrocartilagíneo [4].

Inervação

Segundo O'Brien [4], a inervação tendinosa é apenas aferente, dá-se essencialmente na sua junção miotendinosa e é feita por um de quatro tipos de estruturas:

  • Corpúsculos de Ruffini (Tipo I) - percecionam alterações de pressão e são muito sensíveis ao estiramento.
  • Corpúsculos de Paccini (Tipo II) - ativados pelo movimento
  • Orgãos tendinosos de Golgi (Tipo III) - com a função essencialmente de mecanorrecetores, estes captam alterações por exemplo na pressão muscular exercida à periferia do tendão.
  • Terminações nervosas livres (Tipo IV) - informam essencialmente para a dor [4].

Paul Ackerman et al. propõem que poderá haver uma contribuição do Sistema Nervoso após uma lesão tendinosa. Estes referem que após o corte e sutura do tendão de Aquiles em ratos, foram encontrados sinais de desenvolvimento e crescimento axonal, e que este achado poderá ser extrapolável para seres humanos [6].


Função

Por todas estas características, os tendões são as estruturas que demonstram, por excelência, como a estrutura está intimamente ligada à função, sendo estes estruturas especializadas em transmitir forças, possibilitando o movimento [2] [3] [7] e facilitando a estabilidade articular [8]. Estando os tendões associados a estruturas contráteis, estes necessitam, antes de transmitir, de armazenar a energia proveniente da contração muscular, fazendo-a chegar ao osso, originando o movimento. Estas propriedades permitem dividi-los essencialmente em duas categorias: função de transmissão de forças (Aquiles e rotuliano) e transmissão de movimento (tendões flexores dos dedos, por exemplo) [1].

Os tendões são viscoelásticos, propriedade que é definida pelo facto de a deformação de determinado tecido ser proporcional à intensidade da força que é exercida sobre ele [1].

Wang [8] propôs um gráfico para a deformação a que o tendão está sujeito quando lhe é aplicada uma força. Esta propõe 4 fases distintas: 

Etapas de deformação tendinosa na presença de uma força externa [8]

  •  1ª fase - aproximadamente até aos 2% de estiramento, que representa o alongamento inicial das fibrilas que se encontram ligeiramente "encurtadas". Esta fase depende muito da localização do tendão e varia consoante a sua região.
  • 2ª fase - Nesta fase de alongamento a percentagem de estiramento responde de forma linear ao stress que lhe é exercido, e vai dos 2% até aos 4%, que é o limiar fisiológico de estiramento do tendão.
  • 3ª fase - Entre os 4% e os 8% pode haver pequenos microtraumas, observáveis ao microscópio, que poderão ou não ditar a falha do tendão.
  • 4ª fase - Para além dos 8%, estimadamente até aos 10%, o tendão fica exposto a uma rutura observável macroscopicamente [1].

Wang também refere na descrição e evolução destas fases que a força média para chegar ao limiar fisiológico do tendão rotuliano é de 660 MPa (1 Pa = 1 N/m2), ao passo que para o tendão de Aquiles esta força quase dobra para os 1200 MPa. Para além disso, também está descrito que a idade tem um efeito de redução nesta força mínima necessária para a deformação, sendo que no tendão rotuliano pode haver um decréscimo até cerca dos 504 MPa [1].

Num estudo de 2011, um grupo de investigação dinamarquês estudou as propriedades biomecânicas do tendão de Aquiles numa contração isométrica, e confirmou alguns achados condizentes com os estudos anteriores, nomeadamente no que diz respeito à viscoelasticidade dos tendões [9]. 

Deformação de um tendão (mm) após a aplicação de uma força externa (N) obtida por Kongsgaard [9]

Contudo, estes tiraram uma outra conclusão interessante. Este estudo do comportamento tendinoso foi realizado durante contrações isométricas, nas quais havia pouco ou nenhum deslocamento associado 

O que foi medido foi o deslocamento de ambas as inserções do Aquiles (OTJ - Junção Tenoóssea; MTJ - Junção Miotendinosa) e a deformação global do tendão de Aquiles. Ainda que esta tenha sido mínima (facto coincidente com a ausência de movimento), são possíveis observar deslocamentos consideráveis ao nível das inserções tendinosas na sua proximidade ao longo da contração isométrica dos flexores plantares.

Isto pode ser relevante do ponto de vista clínico, uma vez que implica que mesmo que não haja grande movimento da articulação da tibio-társica, pode ocorrer uma rutura também devido à aplicação de uma forma acima do limiar de extensibilidade miscroscópico dos tecidos, sem ser observável movimento mecânico.

Mecanismo de lesão numa rutura do Tendão de Aquiles 


Fisiopatologia

As lesões no tendão podem provocar perda de mobilidade por uma cinemática incorreta das articulações, resultando em lesões nos tecidos adjacentes (músculo, osso ou cartilagem), osteoartrite e dor [1].

Existe, ou não existe, o termo tendinite? Como se classificam lesões no tendão?

Quase todos os diagnósticos clínicos verificados em tendões, nomeadamente em situações crónicas, são apelidados de tendinite. Por definição, tendinite é um estadio patológico em que um tendão apresenta sinais inflamatórios [3]. Isto tem criado alguma controvérsia no que diz respeito à uniformização na transmissão de informações em saúde, até porque este tipo de classificação não condiz, como vimos, com a histologia tendinosa. De facto, Khan reflete que muita da literatura aponta para propostas de eliminação deste conceito, uma vez que ela cria junto de atletas e treinadores uma sensação de condição benigna que não é necessariamente real. Desta forma, e até se confirmarem nos humanos alguns achados que foram de facto encontrados no tendão de Aquiles de coelhos 5 dias após serem cortados e reparados, o termo "tendinite" deveria ser eliminado devido à confusão entre os especialistas que quando o usam, o fazem para se referir a uma síndrome, e os restantes profissionais, que têm tendência a usá-lo para descrever uma condição clínica [3].

Ora, se abolirmos o termo "t********", podemos usar paratendinite?

Ainda que seja uma condição muito rara, de facto resultados laboratoriais indicam a possibilidade de poder ocorrer a inflamação da bainha do tendão. Esta condição, na qual se insere por exemplo também o conceito de tenossinovite, é definida clinicamente pela presença de edema, hiperémia e infiltrado inflamatório na região paratendinosa. Em casos crónicos ocorre a infiltração de mediadores inflamatórios e de linfócitos, sendo que isso se exprime num adensamento do tendão através da formação de tecido conjuntivo com adesões, e ocorre também o processo de neovascularização, a par da presença de indicadores inflamatórios em cerca de 20% das artérias locais [3].

Reflexões de Khan e Cook acerca das crenças vs evidência nas lesões tendinosas [7]

Tendinose

Desta forma, o termo cientificamente mais preciso para designar uma condição patológica do tendão é o termo tendinose. Este diz respeito a uma degenerescência do tendão sem que este apresente sinais inflamatórios. Os principais indicadores microscópicos são a degeneração do colagénio, com o aumento do tipo III nalguns casos, a desorientação das fibras e aumento da matriz extracelular, que se traduz num aspeto "apagado", acastanhado e mole - quando devia ser branco, brilhante e firme. Isto deve-se ao aparente "afastamento" das fibras de colagénio, juntamente com a sua diminuição em tamanho e densidade global [7]. Devido a estes processos que muitas vezes resultam em pequenas ruturas da matriz de colagénio, é possível ver pequenos depósitos de eritrócitos e fibrina, sem no entanto haver presença marcada de linfócitos ou macrófagos [3]. A par da paratendinite, também na tendinose é frequente ocorrer neovascularização [7].

Proposta de Mecanismo de Lesão do Tendão por sobreuso de Leadbetter (1997)

Resumidamente, uma lesão tendinosa não é mais então do que a degenerescência das suas células, os tenócitos, e dos seus compostos estruturais, as fibras de colagénio, havendo o aumento do espaço ocupado por matriz extracelular. A implicação direta disto é a perda da capacidade funcional do tendão. 

Proposta de Clancy para a classificação de lesões no tendão [9]


Tendinoses mais comuns

As disfunções de tendão mais comuns ocorrem na coifa dos rotadores, no tendão do extensor curto dos dedos, no tendão rotuliano e no tendão de Aquiles [7]. Por motivos de contextualização, e uma vez que as primeiras duas condições acontecem mais na população em geral e não tanto em atletas [7], vamos abordar apenas as últimas duas.

Tendão rotuliano

O tendão rotuliano é o tendão da inserção distal do quadricípite, na tuberosidade anterior da tíbia [10]. Quando disfuncional ou com dor, esta condição é vulgarmente denominada "joelho do saltador" e é caracterizada pela presença de degenerescência tendinosa na região que se insere na tuberosidade anterior da tíbia [3]. À semelhança das tendinoses comuns, esta apresenta alterações na composição do colagénio, tornando-o desorganizado e com uma aparência descontínua, com o eventual surgimento de neovascularização. Para além disso, as próprias células produtoras de colagénio, os tenócitos, aparentam estar presentes em maior número, mas tendo perdido a sua forma original, o que pode indicar uma metaplasia fibrocartilaginosa. Em estádios crónicos não há presença de mediadores inflamatórios [3]. Um achado importante é que este tipo de condição em estádios mais precoces foi evidenciada em joelhos de indivíduos saudáveis, o que aponta para uma degeneração gradual e para a existência de uma possível graduação do nível de acometimento tendinoso [3].


Tendão de Aquiles

O tendão de Aquiles é o tendão único do tricípite sural, começando a cerca de metade do comprimento da perna como a continuação dos gastrocnémios e recebendo mais distalmente a contribuição das fibras profundas do solear, inserindo-se na região posterior do calcâneo [12][13]. Este tendão, especialmente eficaz em atividades de encurtamento-estiramento, pode suportar até 12,5 vezes o peso corporal na tarefa de corrida (9 KN), sendo que a sua solicitação nas tarefas de jump squat é de 2.2 KN e na tarefa de countermovement jump é de 1.9 KN [13]. Os achados anatómicos e bioquímicos assemelham-se aos encontrados nas restantes lesões tendinosas por sobreuso [12].

Alguns estudos referem que uma amplitude de flexão dorsal diminuída pode implicar uma predisposição a desenvolver tendinopatia do tendão de Aquiles. Isto faz sentido do ponto de vista mecânico, uma vez que o tendão vai dispor de uma menor amplitude, e portanto menos tempo, para armazenar a mesma quantidade de energia proveniente das forças que estão a atuar sobre ele [12].

Imagens retiradas do Atlas de Anatomia Netter


Avaliação 

De acordo com a sua fisiopatologia e sinais e sintomas clínicos, a avaliação e consequente diagnóstico em fisioterapia deverá ser efetuado a partir de uma anamnese consistente, através da recolha de dados significativos como o início - quando e como - e progressão dos sintomas, o seu caráter e a presença de SIN. Na avaliação objetiva, os sinais clínicos mais importantes a recolher são a reprodutibilidade da dor ou a incapacidade de realizar a tarefa. Isto poderá indicar um caminho de diagnóstico funcional, que poderá depois ser confirmado através da imagiologia e de análises bioquímicas ao tendão [11].


De forma a avaliar em específico a condição de tendinose, vários estudos tentaram já testar o uso de um questionário cuja aplicação pretende servir de ferramenta complementar ao diagnóstico inicial. A escala VISA (Victorian Institute of Sport Assessment) revelou resultados diferentes entre indivíduos sintomáticos e assintomáticos [11], provando ser uma escala fiável, válida e de resposta simples, assim como o VISA-A, destinado em específico ao tendão Aquiles [12].

[Em anexo colocámos o artigo com a escala VISA disponível]


Intervenção

Como em todas as condições clínicas, o ideal é trabalhar na prevenção: através da atuação ao nível do aconselhamento, no treino e na gestão das suas cargas e ao tornar apropriado o equipamento utilizado, é expectável que seja possível reduzir o número de ocorrência de lesões por sobreuso no tendão.

Contudo, quando esta ocorre, a primeira abordagem do fisioterapeuta deve incidir em avaliar qual dos fatores poderá ter despoletado o aparecimento da dor, e modular o impacto deste no dia-a-dia do atleta. A dor, sendo o fator limitante neste tipo de lesões, deve ser o principal guia durante o tratamento e deve ser gerida com cautela e tendo em conta as diversas exposições do atleta a agentes stressores da condição clínica, caso contrário esta voltará a aparecer no regresso à atividade [16].

A partir daí, o fisioterapeuta poderá delinear o resto seu plano de intervenção.

Rees e Maffuli, numa revisão sistemática acerca da abordagem a tendinopatias, estabeleceram uma série de procedimentos e áreas disciplinares responsáveis por uma intervenção nesta condição. Eles perspetivam como intervenções o tratamento conservador - dentro do qual estão modalidades como o exercício, descanso, ligaduras, crio e eletroterapia e tratamento farmacológico - e o tratamento não-conservador ou cirúrgico [16] (sobre o qual não nos debruçaremos).

Vários procedimentos foram ponderados como intervenção. A utilização de MTP, assim como outras modalidades de terapia manual, não apresentou resultados positivos. As ondas de choque apresentaram resultados promissores na capacidade de regeneração dos tecidos após rutura, mas mesmo assim uma revisão recente propõe que estas sejam uma solução de recurso [16] a ser tida em conta em pequenos grupos de pacientes [17]. A crioterapia, juntamente com a compressão, foi ponderada devido aos seus efeitos fisiológicos, mas supõe-se que o seu benefício se deve às suas propriedades analgésicas e não necessariamente à redução de um eventual processo inflamatório [16]. 

Resultados de técnicas como a mobilização passiva e o alongamento ou PNF permanecem dúbios. Kubo et al. estudou os efeitos do alogamento do tendão de Aquiles durante 10 minutos e encontrou uma diminuição da stiffness tendinosa [18], e estudos também referem uma diminuição desta stiffness após apenas 60 segundos de flexão plantar, efeitos que se mantinham por cerca de 30 minutos [19]. Estes efeitos poderão apresentar benefícios uma vez que uma diminuição da stiffness tendinosa implica um aumento na capacidade de distensão-contração da unidade músculo-tendinosa, tornando-a mais capaz de realizar a sua função de armazenamento e transmissão de energia e, teoricamente, menos suscetível a lesão. Por outro lado, a stiffness tendinosa é uma propriedade importante do tendão para a estabilidade da articulação de que muitos deles são vizinhos. Na verdade, estes resultados ambíguos justificam a ausência de resultados significativos através do tipo de aplicação destas técnicas em planos de prevenção de lesão [19].

Mecanismos fisiológicos subjacentes a uma intervenção conservadora a um tendão [17]


O exercício foi o procedimento mais utilizado para abordar uma lesão no tendão, especialmente a utilização de exercícios excêntricos, uma vez que é proposto que estes sejam os mais eficazes a normalizar a estrutura tendinosa, especialmente quando realizado com cargas elevadas [16] [17].

Revisão sistemática acerca do efeito do exercício no tratamento a tendinopatias [20]

Exercício

Numa resposta aguda ao exercício, o organismo degrada colagénio. Num estudo de 2012, Tardioli et al. verificaram que imediatamente após um protocolo de exercício, a tendência das concentrações de colagénio intratendinoso era diminuir, ao que se seguia um aumento significativo que podia durar até 72 horas, sendo mais alto nas primeiras 24 [19]. Isto é especialmente importante para desenhar plano de treinos quer em períodos de recuperação quer em períodos de reabilitação, uma vez que pode indicar que a capacidade regenerativa do tecido pode ser mais extensa do que aquela a que ele está a ser sujeito.

Também na fase aguda após exercício se verificaram aumentos nos níveis de concentração de prostaglandinas, bradiquininas e adenosinas, constituintes importantes e processos de vasodilatação, o que, a par de achados ao nível de alterações constantes na pressão peritendinosa, pode explicar um aumento da circulação sanguínea local. Isto apoia a teoria de que, ainda que com pouca vascularização, o tendão possui aquela que de facto o seu metabolismo necessita. No mesmo estudo, Tardioli et al. ponderam sobre a fisiopatologia tendinosa e, tendo em conta o aumento do diâmetro destas estruturas, verificam se este aumento se dá durante a fase aguda de determinadas modalidades de exercício (baixa duração vs alta duração e intensidade alta). Curiosamente, não foram encontradas correlações, à exceção de uma que relacionava a espessura do tendão com o tempo de jogo dos atletas. Isto pode ser pertinente para explicar a denominação deste tipo de lesões de "lesões de sobreuso". De facto, programas de exercícios de cerca de uma hora que envolvam exercício concêntricos e excêntricos provaram ser uma boa ferramenta para diminuir a espessura do tendão. [19].

Por fim, Peter Malliaras no seu estudo de 2013 concluiu então que exercícios de alta intensidade (>80% 1RM) são aqueles a que o tendão patelar era mais responsivo, sendo que as contrações excêntricas eram aquelas que maior degradação de colagénio proporcionavam numa primeira fase da intervenção e que, desta forma, otimizavam a regeneração do tecido [21].

Influência de exercício de baixa (em baixo) vs alta (em cima) intensidade [22]


Estando então relativamente bem estabelecido que um protocolo individualizado de exercícios variado, com foco acentuado nos exercícios excêntricos e de alta intensidade, é a melhor ferramenta disponível para reverter uma condição patológica no tendão, é fundamental o fisioterapeuta ser capaz de gerir a carga a que o atleta está sujeito e o volume que coloca neste protocolo, uma vez que o volume moderado é aquele que apresenta adaptações fisiológicas a curto e longo-prazo.

Dose-Response proposta por Wang [1]


Resumindo

  • O tendão é uma estrutura muito peculiar que não responde aos estímulos conforme estruturas puramente inertes ou contráteis. Tem duas funções: transmissão de forças ou de movimento.
  • O tendão pode lesionar-se de uma de duas maneiras: traumatiscmo direto ou lesão de sobreuso, sendo que a segunda é a mais frequente.
  • Nas lesões de sobreuso, ocorre uma degenerescência tecidual, com a perda das suas propriedades viscoelásticas devido á perda e desorganzização de colagénio.
  • Para intervir, é fundamental que o fisioterapeuta seja capaz de aferir qual o mecanismo causador da lesão por sobreuso, podendo este ser devido a má biomecânico, má gestão de carga ou utilização de material desadequado à prática desportiva.
  • As lesões do tendão não reabilitam com uma intervenção baseada em descanso. O processo de reabilitação tendinoso após surgir lesão por sobreuso é demorado e requer paciência e uma intervenção baseada em exercício.
  • Outros tipos de intervenção como terapia manual, eletroterapia ou farmacologia não são devidamente sustentadas pela literatura, podendo mesmo nalguns casos ser contraproducentes.
  • O exercício deve ser variado e estimulante, essencialmente excêntrico e de cargas elevadas com especial atenção à sua dosagem.

Proposta de progressão da intervenção (baseada na literatura e em experts - Seth O'Neill, Peter Malliaras, Jill Cook, Karim Khan, etc.)


Bibliografia

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[17] G. Riley, "Tendinopathy-from basic science to treatment," Nature Clinical Practice, pp. 82-89, 2008.

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[19] A. Tardioli, P. Malliaras e N. Maffulli, "Immediate and short-term effects of exercise on tendon structure: biochemical,biomechanical and imaging responses," British Medical Bulletin, pp. 169-202, 2015.

[20] H.-P. Wiesinger, A. Kosters, E. Muller e O. Seynnes, "Effects of Increased Loading on In Vivo Tendon Properties: A Systematic Review," American College of Sports Medicine, pp. 1885-1895, 2015.

[21] P. Malliaras, B. Kamal, A. Nowell, T. Farley, H. Dhamu, V. Simpson, D. Morrissey, H. Langberg, N. Maffulli e N. Reeves, "Patellar tendon adaptation in relation to load-intensity and contraction type," Journal of Biomechanics, pp. 1893-1899, 2013.

[22] S. Bohm, F. Mersmann e A. Arampatzis, "Human tendon adaptation in response to mechanical loading: a systematic review and exercise healthy adults," Sports Medicine, pp. 1-18, 2015.

[23] J. L. Cook, P. Malliaras, J. D. Luca, R. Ptasznik, M. E. Morris e P. Goldie, "Neovascularization and Pain in Abnormal Patellar Tendons of Active Jumping Athletes," Clin J Sport Med, pp. 296-299, 2004. 


Anexo

VISA Score:


VISA-A Score (específico para  tendão de Aquiles):


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